In memoriam
“Em tempos em que a esperança é um bem escasso, deveria haver uma lei universal que nos protegesse de perder para Deus os seres humanos que no-la restauram e justificam.
Em tempos contraditórios, velados, erráticos, deveriam ficar connosco as pessoas que nos guiam, nos confortam, nos acalmam, nos fazem confiar que há sempre uma forma de o bem prevalecer e que, mesmo à distância, nos inspiram a fazer o melhor por nós, pelo próximo e a respeitar a mais nobre condição do ser humano, com toda a sua dignidade, rectidão e crença num futuro melhor, não esperando, simplesmente, que ele aconteça por geração espontânea.
É sempre triste a perda de um colega de profissão com o qual nos cruzámos, com o qual trocámos desabafos ou opiniões e ainda mais triste quando nos identificamos com a pessoa em questão, cuja admiração nos alimentou a força motriz para alcançar os nosso objectivos, até nos dias mais difíceis.
Este texto está a ser escrito com um misto de dor e de esperança, recordando o nosso nº 7 da OMD – diz-se que acaso é coisa que não existe.
Pela numerologia, o número sete está relacionado com o símbolo da estrela; é o número da perfeição, da espiritualidade, da liderança, das actividades científicas e académicas, da introspecção, do pensamento, da sabedoria, da paz interior. E o Sr. Prof. Doutor João F. C. Carvalho encarnava todas estas qualidades com a distinção de quem quase passava despercebido, sabendo estar próximo de todos, mas destacando-se dos demais, indiscutivelmente, pelos seus princípios e integridade.
Primeiro bastonário da APMD, Pai de família, Médico Dentista e Professor atento e zeloso, com um azul nobre no olhar e no sangue, traçou o seu caminho sem nunca esconder o que sentia e pensava, de forma educada e sólida, tendo na conduta um sentido de dignidade e justiça que contagiava.
Não fui sua aluna, mas quis o destino que eu passasse pela FMDUP como aluna de Mestrado, instituição na qual se doutorou e leccionou, casa essa que me ensinou sobre ciência e clínica, mas muito mais sobre a vida, sobre as verdadeiras hierarquias que contam e sobre a natureza das pessoas. Na minha insignificância anónima e imaturidade e própria da idade de então, muitas vezes não me sentindo à altura dos desafios diários, em dias mais escuros tive a sorte de receber um sorriso plácido, um “bom dia” alegre, uma energia calma de uma das poucas pessoas que – assim acreditei – verdadeiramente me viam”.
Crónica da autoria da médica dentista Cátia Íris Gonçalves, publicada na íntegra na DentalPro 118.
7 Novembro, 2017
Opinião