“Dentistas especiais” precisam-se!

A terapeuta da fala Maria Margarida Campos Andrada faz as devidas apresentações. “Esta é a Unidade de Intervenção Precoce Integrada I (UIPI), do Centro de Reabilitação de Paralisia Cerebral Calouste Gulbenkian (CRPCCB), que recebe jovens com necessidades especiais entre os primeiros meses de vida e os três anos”.

Maria Graça Moreira (educadora de infância) e Maria Margarida Campos Andrada

A turma da Sabrina, do Rafael, da Margarida, da Laura e da Tânia prepara-se para encerrar um ciclo e hoje a terapeuta refere cinco crianças diferentes daquelas que aqui chegaram pela primeira vez e com poucos meses de vida.

Boas práticas de saúde oral

Por definição, paralisia cerebral descreve um conjunto amplo de situações clínicas heterogéneas. É permanente mas não inalterável, originando uma perturbação do movimento e/ ou da postura e da função motora, devida a uma interferência/ lesão/ anomalia não progressiva do cérebro imaturo e em desenvolvimento.

Apesar da deficiência motora constituir a sua manifestação mais evidente, existem frequentemente várias deficiências e incapacidades associadas, nomeadamente défice de visão ou audição, perturbações no desenvolvimento da linguagem e comunicação, problemas perceptivos, dificuldades de aprendizagem e défice cognitivo, podendo também registar-se epilepsia.

Maria Margarida Campos Andrada desenrola o seu trabalho em torno de três grandes objectivos. “Integrar a linguagem e a fala, naqueles em que se revela possível, a alimentação e a higiene oral”.

A terapeuta, que participou na elaboração do Manual de Boas Práticas em Saúde Oral, editado pela Direcção-Geral de Saúde, reconhece a importância de praticar uma boa higiene oral nestes meninos. Aquilo que se exibe como um gesto rotineiro para milhões de crianças em todo o mundo ganha, para estas cinco, uma relevância fulcral.

“A escovagem diária permite ajustar melhor a sensibilidade destes meninos”, sublinha a técnica. “O acto de lavar os dentes, a escova e o sabor da pasta em si constituem adaptabilidades que a boca realiza diariamente, garantindo uma informação intra-oral muito importante. Isto concorre para obter uma resposta mais normal ao nível da mastigação, da mobilidade da língua e da deglutição”, acrescenta.

O médico dentista e docente da Faculdade de Medicina Dentária da Universidade do Porto (FMDUP) David Andrade identifica os principais problemas de saúde oral nestes jovens. “Anomalias dentárias, respiração bucal, deglutição atípica, deficiente higiene oral, maior incidência de cárie, má-oclusão, periodontopatias e bruxismo”. O especialista, que também coordenou o Manual de Boas Práticas em Saúde Oral, instiga os colegas de profissão a sensibilizar as crianças e as famílias para o cumprimento de algumas regras básicas. “Escovar os dentes duas vezes por dia, sendo uma delas ao deitar, implementar uma dieta saudável e pobre em açúcares, usar pastas dentífricas fluoretadas, evitar o traumatismo oral e visitas regulares ao dentista de seis em seis meses, podendo este prazo ser reduzido em situações específicas”. O médico dentista deve ainda atender ao facto de “muitos pacientes com necessidades especiais necessitarem de visitas no seu próprio domicílio ou instituição”, alerta.

Acção transdisciplinar
Os tratamentos médico dentários concorrem para a reabilitação dos casos de paralisia cerebral. Presença “indispensável numa equipa transdisciplinar”, o dentista actua “na melhoria dos aspectos funcionais musculares relacionados com a ventilação oral, na articulação da palavra, na mastigação e na estética”, enumera David Andrade.

A acção da medicina dentária revela-se vital no combate à disfunção respiratória, repercutindo-se no desenvolvimento, na aprendizagem e no sono dos pacientes afectados.

O plano social destaca-se como outras das vertentes do trabalho dos profissionais de saúde oral. “Muitas destas crianças babam-se e só um hálito fresco permite que as pessoas não se afastem delas. São estigmas terríveis, sobre os quais trabalhamos constantemente, para evitar que eles se imponham na vida destes meninos”, revela a terapeuta da fala aria Margarida Campos Andrada.

David Andrade

Só uma higiene oral diária e consequente resolve os problemas que se impõem na cavidade oral dos pacientes com necessidades especiais. Para uma limpeza eficaz, as técnicas de higiene oral devem adaptar-se a cada criança e ao grau da sua insuficiência.

“Cabe aos profissionais avaliar previamente a motricidade oral, as dificuldades em manter a boca aberta, assim como a influência dos reflexos orais primitivos e espasmos, a descoordenação motora, rigidez ou défice cognitivo profundo, podendo promover-se adaptações à escova normal ou eléctrica, que permitam a execução da escovagem”, elucida David Andrade.

aria Margarida Campos Andrada admite que “era óptimo contarmos com a presença de um médico dentista na instituição”. A terapeuta do CRPCCB lamenta a “falta de programas que permitam o acesso a cuidados de saúde oral, até porque sentimos que esta população tem muitas carências, o que dificulta, ainda mais, a ida ao dentista”.

O professor da FMDUP adverte os colegas para as especificidades que caracterizam o trabalho com estas crianças. “Não se trata só de um paciente especial, mas também de uma família muito especial e, para os colegas que desejem atender estas crianças, porque não também um dentista especial”.

23 Junho, 2010
Atualidade

 
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