Meu querido propofol
Crónica da autoria de Cátia Íris Gonçalves, médica dentista.
Eu, que sempre tive um fraquinho por música, ainda que tenha um entendimento peculiar com músicos, não censuro o Michael Jackson, na sua suposta simpatia por este agradável fármaco (o propofol, caso não tenham reparado no título da crónica).
Não há arte mais bonita, espontânea, imediata e indomável como a música.
E escrevo-vos estas palavras numa semana em que ouço uma em particular, em repeat, na minha cabeça, por ter marcado um momento menos feliz que revisito, de forma a lidar com ele às parcelas, à medida do meu tempo – que parte do cérebro será responsável pela memória musical de uma melodia que nos carimba as sinapses e nos faz adormecer e despertar ao seu som?
Um miúdo, que não conhecia, foi ao bloco [operatório] hoje. Um miúdo da mesma idade da minha filha, que dos bicos dos pés da sua saúde, ritmo cardíaco invejável e argumentos sólidos, vi adormecer serenamente, mas não sem antes estrebuchar em espasmos de resistência corporal, material, física, porque isto da vida terrena tem muito que se lhe diga de discordância entre corpo e alma.
[O miúdo] foi anestesiado, a pedido da mãe, com anestesia inalatória, antes da intravenosa (propofol), esse sacana delicioso que, seguramente, a mãe conhece mal.
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12 Janeiro, 2023
Opinião
